sexta-feira, 24 de julho de 2009

ELUCUBRAÇÕES



O conceito de necessidade proposto por Espinosa foi principalmente porque ele era contra a idéia cristã de livre-arbítrio (free will). Espinosa criou um sistema em que necessidade = liberdade, algo totalmente novo na história da filosofia.

Marilena Chauí em entrevista acerca do seu monumental livro "A Nervura do Real".

Essas discussões são ótimas como terapia, como preparação para a Filosofia Perene. Acabar com qualquer resquício da idéia de um Deus Criador é um bom exemplo do poder de Espinosa.


[Paul Davies]

"Ao referir-se à pergunta sobre a liberdade de Deus em criar um mundo à sua escolha, Einstein aludia a Benedictus
Spinoza, filósofo do século XVII. Spinoza era panteísta, encarava os objetos do universo físico como atributos, e não
como criação de Deus. Ao identificar Deus e natureza, Spinoza rejeitou a idéia cristã de uma Divindade transcendente que criara o universo num ato livre. Além disso, Spinoza não era ateu: acreditava dispor de uma prova lógica de que Deus tem de existir. Dado que identificava Deus e o universo físico, esta identificação constituía uma prova de que nosso universo particular também tem de existir. Para Spinoza, Deus não teve escolha nesse ponto: "As coisas não poderiam ter sido geradas por Deus de qualquer outra maneira ou em qualquer ordem diferente da que de fato obteve", escreveu ele."

Spinoza não era panteísta, mas é difícil entender as peculiaridades nisto envolvidas. Veja mais na entrevista. Eu vejo assim: Marilena Chauí usa o conceito vulgar de panteísmo ("Deus=Mundo") ao negá-lo em Spinoza. Mas o conceito sofisticado de panteísmo ("Deus não está separado de suas manifestações", ou mesmo "Deus é, também, o mundo inteiro"), talvez se assemelhe com o pensamento de Spinoza.

"[...] como tudo decorre de necessidade lógica, a natureza do universo seria dedutível da mera razão. "Considero que é verdade", escreveu Einstein quando andava flertando com essa idéia, "que o pensamento puro pode apreender a realidade, como sonhavam os antigos [...] Por meio de construções puramente matemáticas, podemos descobrir os conceitos e as leis que os articulam uns aos outros, estando aqui a chave para a compreensão dos fenômenos naturais." Claro que podemos não ter inteligência suficiente para realmente chegar aos conceitos e às leis corretas apenas pela dedução matemática, mas não é disto que se trata. Se este esquema explicativo fechado fosse sequer possível, nosso pensamento sobre o universo, e o nosso lugar dentro dele, sofreriam profunda alteração. mas será que essa pretensão à completeza e à unidade tem algum fundamento, ou não passa de uma vaga esperança?""

O pensamento não pode abarcar a realidade inteira justamente por ser parte dela. As teorias representacionistas (a mente apenas representa o mundo e podemos representar todas as coisas, pois tudo é inteligível) estão acabando. David Bohm, Humberto Maturana, Edgar Morin, Kant, Wittgenstein, Nagarjuna... todos são contra o representacionismo.

A "Ética" é de dificíl compreensão. Vou fazer apenas uma pequena abordagem sobre o tema da “Ética” apenas na Parte III e isso já é um problemão. Abaixo vou tentar apenas esboçar a idéia geral apenas como uma propedêutica.


"Spinoza define Deus em Ética:

I. Por causa em si entendo aquilo cuja essência envolve a existência; ou por outras palavras, aquilo cuja natureza não pode ser concebida senão como existente.

Deus é tudo e o todo. Tudo existe em Deus, como modos finitos singulares de seus infinitos atributos. Eternidade, para Espinosa, nada mais é que a identidade entre existência e essência. Infinito não é algo sem fim, mas um único ponto que a tudo contém: a idéia de um infinito atual (ver mais em "Correspondência",
na coleção Os Pensadores)


II. Diz-se que uma coisa é finita no seu gênero quando pode ser limitada por outra coisa da mesma natureza.

III. Por substância entendo o que existe em si e por si é concebido, isto é, aquilo cujo conceito não carece do conceito de outra coisa do qual deva ser formado.

Só há uma substância - impossível a existência de dois infinitos (ou dois Deuses). Essa substância é Deus. O homem é um modo (uma modificação) de dois atributos (extensão e pensamento) da única substância.

IV. Por atributo entendo o que o intelecto percebe da substância como constituindo a essência dela.

V. Por modo entendo as afecções da substância, isto é, o que existe noutra coisa pela qual também é concebido.

VI. Por Deus entendo o ente absolutamente infinito, isto é, uma substância que consta de infinitos atributos, cada um
dos quais exprime uma essência eterna e infinita.

Somos mortais, mas eternos. Eternos em Deus.

VII. Diz-se livre o que existe exclusivamente pela necessidade da sua natureza e por si só é determinado a agir; e
dir-se-á necessário, ou mais propriamente, coagido, o que é determinado por outra coisa a existir e a operar de certa e determinada maneira.

Liberdade não é escolha dentre alternativas. Liberdade é ação consciente, ação necessária, daquele que expressa a sua natureza. Por exemplo, Espinosa diz que a natureza da mente é conhecer. Livre é aquele que conhece, que expressa a sua natureza. A felicidade acompanha este processo. E o pensador acrescenta: quanto mais o homem conhece, mais ele é livre, e mais ele fica feliz.

VIII. Por eternidade entendo a própria existência enquanto concebida como sequência necessária da mera definição de coisa eterna.

Seria impossível a não-existência de algo eterno. Por exemplo, você tem de existir, pois eternidade é o sem-tempo (Spinoza concorda com a Filosofia Perene, neste ponto). Se Deus é pura perfeição, infinitos atributos, e tudo já existe, pois é eterno, você necessariamente existe.

Explicação: Pois que tal existência se concebe, assim como a essência da coisa, como verdade eterna, daí resulta que não pode ser explicada pela duração ou pelo tempo, ainda que se conceba a duração sem começo nem fim.

Espinosa nunca trabalha com o conceito de tempo como realidade, e sim com a idéia de duração.
A duração é a nossa existência. Tempo é um modo de pensar a duração (ver "Pensamento Metafísicos", na coleção "Os Pensadores").


Spinoza define essência:

“Digo que pertence à essência de uma coisa aquilo que, sendo dado, faz necessariamente com que a coisa exista e que, sendo suprimido, faz necessariamente com que a coisa não exista; por outras palavras, aquilo sem o qual a coisa não pode nem existir nem ser concebida e, reciprocamente, aquilo que, sem a coisa, não pode nem existir nem ser concebido."

"Por Deus entendo o ente absolutamente infinito, isto é, uma substância que consta de infinitos atributos, cada um dos quais exprime uma essência eterna e infinita."

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